Nos últimos anos, thrillers de moralidade ganharam espaço no cinema, especialmente aqueles que colocam personagens em situações extremas onde dinheiro e sobrevivência se tornam questões centrais. Loteria Fatal (Your Lucky Day, 2023), dirigido por Dan Brown, disponível na Max, é um desses filmes. A trama parte de uma premissa simples, mas eficiente: um bilhete de loteria premiado desencadeia uma série de eventos trágicos dentro de uma loja de conveniência. Mas quais são as principais questões levantadas pelo filme? E como seu final pode ser interpretado?
O que motiva os personagens de Loteria Fatal
A trama de Loteria Fatal se inicia na véspera de Natal, quando um homem descobre que ganhou US$ 156 milhões na loteria. No entanto, sua celebração é interrompida por Sterling (Angus Cloud), um jovem traficante que, ao perceber a oportunidade, tenta roubar o bilhete. Esse evento inicial serve como o estopim para um conflito maior, envolvendo testemunhas que, a princípio, parecem vítimas, mas que logo se mostram dispostas a fazer qualquer coisa para garantir uma parte do dinheiro.
O que torna a narrativa interessante é a forma como cada personagem reage à possibilidade de ficar milionário. Inicialmente, há uma clara divisão entre vítima e criminoso, mas conforme a tensão aumenta, os papéis se misturam. A pergunta que permeia o filme é: até onde uma pessoa comum estaria disposta a ir por dinheiro? A obra explora esse dilema moral ao apresentar personagens que gradualmente deixam de ser apenas reféns para se tornarem cúmplices e traidores.
O problema dos policiais corruptos
Outro ponto central do filme é a crítica ao sistema policial. Em determinado momento, policiais de folga descobrem o que está acontecendo e, ao invés de intervir para impedir a tragédia, decidem participar da disputa pelo bilhete premiado. Essa reviravolta, embora coerente dentro da proposta de questionar a ganância humana, peca por ser previsível e mal construída. O filme sugere que a corrupção policial não é apenas uma consequência do sistema, mas uma escolha fácil quando o dinheiro está em jogo.
A forma como esses policiais são apresentados também gera críticas. Eles discutem casualmente suas dificuldades financeiras, criando uma justificativa rasa para sua corrupção. Isso enfraquece o impacto da crítica social pretendida pelo filme, tornando essa subtrama menos impactante do que poderia ser.
Embora Loteria Fatal tente construir uma atmosfera de tensão, algumas escolhas narrativas prejudicam a imersão do espectador. A cena em que uma mulher grávida leva um tiro na barriga e, logo depois, dá à luz sem grandes dificuldades, exemplifica um problema recorrente no filme: a falta de verossimilhança em momentos-chave. Outro exemplo é o deslocamento instantâneo de personagens entre locais distantes, algo que enfraquece a sensação de urgência e realidade.
Esses momentos destoam do tom geral da narrativa de Loteria Fatal, que busca ser um thriller realista e psicológico. Quando o filme exige que o espectador aceite situações tão improváveis, ele acaba perdendo parte de sua força dramática.
O final explicado de Loteria Fatal: vale tudo por dinheiro?
Na conclusão do filme, a violência atinge seu ápice. Quase todos os envolvidos na disputa pelo bilhete acabam mortos, restando apenas Ana Marlene (a mulher grávida interpretada por Jessica Garza), seu marido Abraham (Elliot Knight) e um dos policiais. Em um ato simbólico, ela finalmente sai da loja com o bilhete premiado, representando a sobrevivente de um ciclo de ganância e destruição. No entanto, a vitória dela é ambígua: será que o dinheiro realmente trará um futuro melhor ou apenas perpetuará a violência que o gerou?
O desfecho sugere que, mesmo diante de um prêmio milionário, não há vencedores reais. Todos que tentaram se apossar do bilhete pagaram um preço alto, e o dinheiro, que deveria representar liberdade, se tornou uma maldição. A última cena deixa um gosto amargo, reforçando a ideia de que a ganância é um jogo perigoso, onde ninguém sai ileso.
Loteria Fatal vai ter sequência? Onde posso assistir?
Vale ressaltar que esse não é um thriller perfeito. Seus diálogos expositivos, inconsistências narrativas e decisões questionáveis no roteiro podem frustrar o espectador mais exigente. No entanto, a temática que propõe – a fragilidade da moralidade humana diante da promessa de riqueza – é sempre relevante. O filme se torna ainda mais significativo por ser um dos últimos trabalhos de Angus Cloud, cujo desempenho, apesar das limitações do roteiro, adiciona intensidade ao protagonista.
No fim, o longa levanta questões importantes sobre ética e ganância, mas entrega respostas previsíveis. Sua força está na premissa intrigante, ainda que sua execução nem sempre faça jus à ideia inicial. Para quem busca um thriller descompromissado, pode valer a pena conferir. Mas, assim como no filme, a sorte é um fator determinante – e talvez seja melhor apostar em outro título. Ainda assim, você pode assistir Loteria Fatal no serviço de streaming Max (acesse aqui, se for assinante).
Em relação à continuidade da história, algumas coisas ficam em aberto como o destino dos ganhadores do prêmio e as consequências dos seus atos, assim como a repercussão a respeito da morte do ganhador original, que foi deixado abandonado em um carro juntamente com a arma do crime. Porém, ainda assim não há como afirmar que Loteria Fatal vai ter sequência, pois não há nenhuma declaração do diretor a respeito.
Seu próximo projeto será o filme Survivor, atualmente em pré-produção, adaptação do livro homônimo de Chuck Palahniuk (lançado no Brasil como “Sobrevivente” pela editora Leya, em 2012), mesmo autor do clássico Clube da Luta.